quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Blogs e Produção de Conteúdo

No post de ontem, falei sobre a necessidade de mantermos a informação circulando livremente para que possamos criar uma sociedade mais livre. Falei um pouco sobre blogs, e o papel que andam cumprindo de quebrar o monopólio da Mídia Tradicional. Após ter publicado o texto anterior, percebi que há muito mais a ser dito sobre este assunto.

Antes de mais nada, é necessário dizer que, embora eu tenha falado em blogs (e tenha até colocado o termo no título desse texto), eles são apenas parte de um fenômeno mais amplo, que é conhecido por Conteúdo Gerado por Usuários (do inglês User Generated Content - UGC). UGC, de maneira geral, é todo conteúdo original produzido por pessoas que não estão diretamente ligadas à Mídia Tradicional, através de sites pessoais, vídeos, blogs, comentários em sites alheios, o diabo (quem tiver interesse, a Wikipedia tem um artigo sobre isso). Onde o UGC começa e onde ele termina não é muito claro para mim, já que é possível um jornalista contratado pela Zero Hora ter um blog pessoal, ou companhias mais tradicionais podem usar algum tipo de recurso UGC para interagir com seu público alvo. Ainda assim, o fenômeno é bastante claro, e pode ser resumido da seguinte forma: cada vez mais pessoas têm acesso direto aos meios de comunicação, sem a necessidade de algum mediador, como jornais, revistas ou emissoras de televisão.

Isto tem uma série de efeitos. O primeiro, do qual eu já falei no texto anterior, é a quebra do monopólio da informação. Como mais e mais pessoas estão compartilhando seus pontos de vista sobre os fatos importantes, não precisamos mais acreditar no que a Globo, a Record ou a CNN nos dizem. O caso da desocupação do bairro Pinheirinho, em São José dos Campos, é um bom exemplo disso. Enquanto que a revista Veja publica um artigo escrito por um senador do PSDB afirmando que tudo ocorreu dentro dos conformes, sem nenhuma morte ou violência, milhares de blogs e perfis no Facebook divulgam fotos e informes em primeira mão dos crimes cometidos pela Polícia Militar, como o assassinato de uma criança de um ano, a agressão gratuita contra jornalistas e partidários da esquerda, e a prisão ilegal de deputados e senadores ligados à causa dos direitos humanos que lá foram investigar o que estava acontecendo. Quem está falando a verdade aqui? Em última análise, eu não tenho como saber com certeza, por que não estive em Pinheirinho, mas não preciso aceitar a versão da Veja como a última palavra, e escolher em quem eu acredito, baseado em considerações racionais (por exemplo: será que a Veja teria algo a ganhar ao defender as causas do PSDB e atacar os partidos de esquerda, especialmente o PT? Muito provavelmente, para ficar nos eufemismos).

Há, contudo, outros efeitos do UGC que eu não discuti no post anterior. O primeiro deles é que só por que aumentou a quantidade de conteúdo disponível não quer dizer que este conteúdo seja de boa qualidade. É a famosa Lei de Sturgeon, que afirma que "90% de tudo que já foi feito é porcaria." Essa lei se aplica aos blogs, vlogs e tudo o mais que está sendo produzido por usuários da internet. Deve-se levar em conta que estes novos produtores de conteúdo não são profissionais da área. Como eu, ganham seu dinheiro trabalhando em alguma coisa não relacionada à mídia, e usam seu tempo ocioso para escrever um texto ou gravar um vídeo discutindo algum assunto do seu interesse. Eles não são pagos para isso. Aliás, é razoável dizer que eles precisam pagar para produzir conteúdo, seja através da conta da internet, seja utilizando um tempo que poderia ser empregado trabalhando para ganhar mais dinheiro. Neste caso, a Mídia Tradicional tem uma vantagem, que é a de contar com profissionais dedicados exclusivamente a produzir conteúdo, treinados e pagos para investigar, pesquisar, escrever e editar informações. Isto não significa que o conteúdo produzido pelos jornais e mídias tradicionais seja de melhor qualidade do que aquele gerado por usuários (as milhares de gafes que aparecem em sites profissionais como o G1 que o Cardoso adora cutucar são prova disso), mas que ele é feito em melhores condições, o que aumenta a probabilidade de ser de melhor qualidade, ou de ser mais amplamente distribuído.

Penso que ainda não existe nenhum blog que possa competir em influência com a Veja ou a Zero Hora principalmente por isso. Entretanto, também tenho a impressão de que a influência gerada pelo UGC é diferente daquela exercida pela velha mídia. Em primeiro lugar, ela é muito mais quantitativa do que qualitativa. Quando leio uma reportagem da Veja ou qualquer outra revista, é o nome dela, a "grife", que me diz que estou lendo informação de boa qualidade (ou não, já que é da Veja que estamos falando). Nas redes sociais, penso que a quantidade de pessoas compartilhando uma notícia é bastante importante, por que mostra o "buzz", ou a mobilização gerada pela notícia. Em segundo lugar, ela é muito mais pessoal e próxima. Aquilo que eu sei sobre o caso Pinheirinho eu não li na Veja: recebi de amigos e conhecidos, pessoas próximas, que conheço pessoalmente e em quem confio. Posso conhecer o nome de um ou dois jornalistas contratados pela Zero Hora ou pelo Pioneiro, e até mesmo ser capaz de identificar o estilo deles de tanto que li seus textos, mas continua sendo uma relação bastante impessoal e distante. Então, se minhas hipóteses estiverem corretas, não é possível, nem desejável, que um único blog se torne tão influente quanto uma revista de grande porte, por que então perderia sua característica pessoal e humana, e se tornaria apenas uma revista virtual. Entretanto, posso estar equivocado, e um site mantido por usuários, e não por profissionais da informação, se mantenha pessoal e próximo como a maioria dos blogs, mas exerça uma influência grande o bastante para ameaçar a grande mídia. Não posso citar nenhum exemplo disto até agora, mas portais de entretenimento como o Channel Awesome estão, penso eu, bastante próximos disto.

EDIÇÃO: Encontrei um texto do Cardoso que merece ser compartilhado aqui - "Cazaquistão e o oposto do sofativismo." É uma ótima leitura, e um ótimo exemplo do que falei no post anterior.