quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Dramas de Estágio (Parte 11) - Jedi Academy

Já fazem duas semanas desde que comecei a atender no Ambulatório do Departamento de Genética, e dentro de um mês iniciarei meu estágio básico oficial no Morada São Pedro. Posso dizer que, apesar de ainda ter um ano inteiro como estagiário pela frente, este assunto está encerrado, ou melhor dizendo, o barco já está em alto-mar, e não há mais nada que eu possa fazer a respeito (exceto sair do estágio no São Pedro, o que seria o equivalente a pular na água e ir nadando até o mar, mas vou deixar essa metáfora para lá). Restam-me ainda os dois estágios de ênfase obrigatórios, e um possível terceiro estágio opcional, caso eu decida cursar as três ênfases (depois de comer muito cocô).

Um dos fatores que mais influenciaram minha decisão sobre quais em locais estagiar foi o tipo de experiência que eles me proporcionariam, e que quanto mais variadas elas fossem, melhor. Decidi trabalhar tanto no São Pedro quanto no Ambulatório de Genética por que são dois ambientes muito diferentes, tanto no público que atendem quanto na metodologia que empregam, e por que acredito que este "choque de culturas" me será benéfico por estimular uma maior flexibilidade cognitiva e enriquecer meu repetório como psicólogo. Só estou trabalhando no Ambulatório até agora e não tive oportunidade de comprovar isso na prática, mas estou bastante seguro de que minha hipótese está correta.

Quando pensei pela primeira vez onde fazer meus estágios de ênfase, cheguei em três locais ideais: o Instituto Psiquiátrico Forense, o Estação Psi e a Clínica São José. Contudo, analisando friamente e comparando estes locais com os que trabalharei por todo este ano, eles são parecidos demais. Tanto o Insituto Psiquiátrico Forense, quanto o Estação Psi e o Ambulatório atendem pessoas em conflito com com a lei - a única diferença entre eles é que, no primeiro, o público consiste de pessoas com sofrimento mental severo, que torna a internação necessária, enquanto que nos dois últimos são menores em conflito com a lei. E a Clínica São José, da mesma forma que o São Pedro e o IPF, atende pacientes psicóticos. Seria mais do mesmo para mim.

Tendo isto em vista, comecei a pensar em outros locais para aprender outras coisas, e passei a cogitar locais que antes não me atraiam tanto. Para a ênfase em Psicologia Social, eu poderia fazer estágio em alguma secretaria municipal, como a Secretaria Municipal de Educação (SMED), que já tem uma parceria forte com a UFRGS, e para a ênfase em Desenvolvimento Humano, em uma clínica particular. Interesso-me especialmente pela WP. Falarei a respeito disto mais para a frente.

Cinema e Ação

Esse final de semana, assisti dois filmes seguidos de Star Wars. O primeiro foi "Clone Wars", longa de animação digital e o segundo foi "Star Wars: Episódio IV - Uma Nova Esperança" da antiga trilogia. Além de poder ver a história em dois momentos muito diferentes, também há outra diferença intrigante: a velocidade dos dois filmes. "Clone Wars" é ação do começo ao fim: duelos de sabre de luz, explosões grandes e barulhentas, milhares de dróides e clones confrontando-se na tela ao mesmo tempo, muitas cores extremamente brilhantes e chamativas, e uma trilha sonora que aumenta ainda mais o impacto visual, tudo feito com a mais moderna tecnologia disponível para os diretores de cinema. "Uma Nova Esperança", por outro lado, apesar de ser claramente um filme aventuresco, é muito mais parado, leva muito mais tempo para explicar sua história, introduzir seus personagens e apresentar seu universo ao espectador. Mesmo suas cenas de batalha são muito mais lentas - basta comparar o assalto à Estrela da Morte pela Aliança Rebelde com qualquer outra cena de batalha espacial de qualquer um dos filmes da nova trilogia, ou, fazendo uma comparação ainda mais dramática, o duelo entre Darth Vader e Obi-Wan Kenobi em "Uma Nova Esperança" e "A Vingança dos Sith".

Apesar de não tratar estritamente do mesmo assunto, este post tem muito em comum com um texto que o Marcelo escreveu sobre doce de figo. Neste artigo, ele comenta que, ao contrário de sua avó e sua tia, ele geralmente dispensa os doces mais tradicionais, como ambrosia ou pessegada, pois, tendo sido criado em uma época tão cheia de comidas fortemente doces e estimulantes (quando não coloridas), os doces que os mais antigos comiam já não são suficientemente "potentes" para atingir seu limiar de doçura e satisfazê-lo. Tanto Marcelo quanto eu pertencemos à uma geração superestimulada, não só em termos gustativos, mas também em termos cinematográficos.

Quando "Star Wars" saiu nos cinemas pela primeira vez, lá na década de 1970, fez estrondoso sucesso por causa de seus efeitos especiais, cenas de ação e história envolvente. Meu pai, por exemplo, esperou ansiosamente pelo lançamento do Episódio VI no Brasil, por longos dois ou três anos. E, mais uma vez, aqui é que está: que seqüência de filme popular levaria tanto tempo para entrar em cartaz hoje em dia? Mais importante ainda, quais as chances de um filme como os da antiga trilogia de "Star Wars" fazer sucesso hoje em dia? Não quero ser apressado e dizer de cara que suas chances são zero, mas é forçoso acreditar que, competindo com megaproduções como "Piratas do Caribe", "Homens de Preto" e, por que não?, os últimos três filmes da saga de "Star Wars", elas seriam bem pequenas.

Somos uma geração acelerada. Uma professora minha, cuja linha de pesquisa é "psicanálise, cinema e cadeias associativas", em todas as suas pachorrentas aulas falou que, nos princípios da Sétima Arte, os cineastas lançavam mão de recursos de linguagem como mostrar um galo cantando ou a mensagem "E na manhã seguinte..." para explicitar a passagem do tempo. Hoje em dia não se faz mais isso por que simplesmente não é necessário. Apenas assistindo o filme, sabemos que é outro dia a partir de sinais muito mais sutis, como a mudança de roupa, de cenário ou através do diálogo. Se trouxéssemos para os dias de hoje um dos irmãos Lumière, ele seria incapaz de entender um filme como "Batman Begins". Não precisamos ir tão longe: minha avó não consegue assistir "Forrest Gump" sem ficar perguntando onde está o guri do começo do filme, por que ela não consegue entender que ele cresceu e é o Tom Hanks (e por que ela sempre dorme a metade dos filmes que assiste), e mesmo meu pai se perde com a história de alguns filmes! Isto não acontece por burrice ou algo parecido: eles simplesmente não estão acostumados. Nós, por outro lado, crescemos neste mundo acelerado, superestimulante, louco, somos neurologicamente preparados para absorver informação "de alta velocidade" e estes filmes "vibram na mesma freqüência" que nós. Para os amantes da tecnologia e do futurismo, isto é fantástico, a própria evolução acontecendo diante de nossos olhos, mas ela não necessariamente é uma coisa boa.

No final de seu post, Marcelo lança uma pergunta: estará o doce de figo com os dias contados? Tenho, eu também, uma pergunta para fazer: chegará o dia meus pais não conseguirão mais entender os lançamentos do cinema, por não terem a velocidade mental necessária para tanto, e que clássicos como "Casablanca", os antigos "Star Wars" e "O Poderoso Chefão" serão escanteados e esquecidos pelas gerações mais recentes por serem parados demais? Francamente, eu não sei. Contudo, eu tenho um palpite.

Mesmo sendo lentos (pelo menos se comparados com os filmes de hoje em dia), os episódios antigos de Star Wars ainda me divertem, me inspiram, me emocionam, não por que seus efeitos especiais de explosões sejam fantásticos, ou por que suas cenas de ação sejam estimulantes ao extremo, mas por que sua história me toca. Luke Skywalker não tem a mesma pinta de herói implacável que seu pai Anakin, mas consegue ser muito mais próximo de nós. Eles têm aquilo que faz de nós humanos, e não qualquer outra coisa por aí. Talvez nossa geração consiga processar muito mais informação do que nossos pais ou nossos avôs, mas estejamos perdendo gradativamente a capacidade se contentar com pouco, de achar doce de figo gostoso apesar de não ser uma explosão de sabor como o leite condensado, ou de apreciar a beleza lenta de um pôr do sol e, talvez, estejamos deixando de ser cada vez menos humanos para nos tornarmos cada vez mais máquinas. Mas são só "talvezes", que podem ou não tornar-se realidade. Não creio que isto acontecerá, pois acredito que, sempre que estivermos ali, quase caíndo no abismo da desumanização, haverá quem nos lembre de apreciar um filme pelo que há de humano nele.