domingo, 12 de outubro de 2008

Eu e a Literatura

Considero a literatura uma das mais fantásticas criações humanas. Não falo da capacidade geral de escrita, desenvolvida eras atrás por alguma civilização obscura, mas dos trabalhos maravilhosos que surgiram através dela. Não canso de me impressionar com o fato de ser possível pegar um livro escrito centenas de anos atrás e ainda assim não apenas entender o que o autor queria dizer, mas sentir empatia e identificação com ele. Carl Rogers, em seu livro “Tornar-se Pessoa”, fala que não pode deixar de considerar o filósofo Soren Kierkegaard um amigo sensível e altamente receptivo, mesmo tendo ele morrido há mais de cem anos. E sou obrigado a dizer o mesmo de Rogers, que apesar de ter morrido antes mesmo de meu nascimento, influencia-me bastante com sua serena e apaixonada defesa da liberdade humana para crescer e da pesquisa científica como um meio para este crescimento. Outro amigo meu é Tolstoi, que em “My Confession” relata o angustiante caminho que trilhou, da descrença em tudo que lhe fora ensinado anteriormente, de seu desespero e suas idéias de suicídio até a sua salvação através da descoberta de um novo sentido espiritual para sua vida. Ele, junto com outros tantos escritores, falecidos ou não, cujos livros me marcaram levam-me a crer que a literatura é mais do que um amontoado de palavras unidas de forma coerente ou mera forma de sublimar a libido, mas uma verdadeira irmandade humana, que me leva a conhecer o melhor de mim mesmo através das descobertas que outros deixaram aqui antes de partirem.

Vida Dura (Parte 18)

E hoje, dia 12 de outubro, é Dia das Crianças. Mais uma data fajuta inventada para forçar pais, mães, padrinhos, madrinhas, avôs, avós e praticamente todo tipo de ser humano diretamente ligado ao trato de crianças gaste seu rico dinheirinho nos brinquedos da moda, roupas de grifes do tipo "Tigor T. Tigre", comidas insalubres e outras porcarias para acalmar a sanha materialista de seus pimpolhos.

Mas não estou criticando o Dia das Crianças, muito pelo contrário! Durante um bom tempo eu fui um grande beneficiário do 12 de outubro, levando meus pais a gastarem seus salários em algum brinquedo especialmente chamativo que vi em algum lugar por aí, e que em menos de um ano (ou menos de um mês) era esquecido e substituído por outro. Considerando que as porcarias que me atraiam eram provavelmente caras, não era um bom negócio do ponto de vista financeiro para meus pais reforçar este meu comportamento, mas acho que era melhor do que me ver esperneando e gritando no meio do supermercado pelo boneco "Megavoltronzord" e suportar olhares de desaprovação de todos os transeuntes. Também há de se argumentar que o sorriso de uma criança não tem preço, especialmente se for do seu filho. Isso parece propaganda de loja de produtos infantis, mas também deve ter seu fundo de verdade (não que eu saiba na prática, considerando que não tenho filhos).

Quando pequeno, eu dividia os presentes que recebia em duas grandes classes: brinquedos e roupas. Se alguém quisesse me fazer feliz, era só me dar um brinquedo, por mais fuleiro que fosse. Roupas são OK hoje em dia para mim, mas lá pelos meus oito ou nove anos, elas eram para mim o que os americanos chamam de "big fucking no-no". Em outras palavras, eu via roupas como brinquedos não ganhos. Meus pais sabiam (e sabem até hoje) que se eu tiver que escolher entre algum gadget e peças de vestuário, eu não hesitarei em escolher o primeiro, e por isso já iam pedindo desculpas quando apareciam com uma camiseta para eu experimentar ou não contavam as roupas que me compravam como presentes. Já meus parentes, padrinhos e semelhantes nem sempre sabiam disto, e apareciam com uma blusa (com um palhaço ou similar bordado na frente, possivelmente piniquento) embrulhada cuidadosamente em papel vermelho. Nas primeiras vezes que isto aconteceu, peguei o embrulho, rasguei-o com ardor esperando encontrar alguma traquitana super-mega divertida para me decepcionar com um amontoado de lã costurado. E enquanto eu era exortado a vestir a nova roupinha ficava pensando "Cadê meu Hot Wheels, cacete?", ou a coisa mais parecida que minha mente infantil era capaz de formular. Para quê eu iria querer roupas novas? Aquela calça de abrigo manchada de lama e minhas camisetas do Mickey sujas de chocolate eram mais do que suficiente! Minha mãe discordava de mim (e até hoje me enche o saco dizendo que eu preciso de mais roupas) e provavelmente ficava tão entusiasmada quanto eu ficava desapontado com roupas.

Claro, nunca expressei diretamente minha raiva contra as pessoas que me compravam roupas de Dia das Crianças (e aniversário, Natal ou qualquer outra data-desculpa), pois fui bem educado pelo meus pais, que colaboraram com sua parte para continuar o mal-estar da civilização que Freud falava, e me ensinaram a não reclamar dos meus presentes. Não em público pelo menos.

Com o tempo, aprendi a identificar o tipo de presente ainda pelo embrulho. Pacote grande, mole e levemente disforme? Blusão. Disforme, mas pouco volumoso? Deve ser uma camiseta. Na verdade, não pensava muito no que havia dentro do embrulho, por que depois de descobrir que ganharia mais roupas, meu cérebro só conseguia pensar "NÃO É BRINQUEDO!", e era forçado a conter o desapontamento de se expressar de maneira muito óbvia.

Como já disse antes, hoje não me importo em ganhar roupas de presente, apesar de não me sentir entusiasmado com a possibilidade. A não ser que a roupa em questão seja uma camiseta com uma estampa inteligentemente abobada. Quanto aos brinquedos, ainda gosto mais deles, mas meus interesses mudaram bastante e se tornaram mais restritos. Por exemplo, um bonequinho do Pikachu não é o tipo da coisa que eu pediria para um Amigo Secreto, o que é algo bem significativo para quem já teve de ouvir do próprio pai que eu preferiria assistir Pokémon a fazer sexo. Gosto ainda de jogos de computador, mas disponho de tão pouco tempo para jogá-los que acho desperdício comprar mais deles. Gadgets como pendrives e HDs externos são sempre bem vindos.

Mas, para ser sincero, não vejo muita necessidade em ganhar presentes hoje em dia. Claro, é legal ganhar coisas, mas não é algo de que eu precise. A não ser que sejam livros. Eu sempre preciso de livros, apesar de já ter uma pilha bem grande aqui do meu lado.