sexta-feira, 11 de abril de 2008

Uma Guerra Antiga

Um de meus assuntos preferidos é falar de Ciência. Geralmente, falo de Ciências Humanas, defendendo-as e defendendo um maior rigor em seus métodos e uma eterna busca pela Verdade, mesmo que no fim ela seja uma farsa. Não falo com muita freqüência de Ciências Exatas como Física, Matemática e Química, mas geralmente as uso como exemplos positivos.

E de fato, as Ciências Exatas são, de longe, as que mais progrediram ao longo da história da humanidade, tanto que seu modelo foi adaptado (sem sucesso, admito) para o estudo das Ciências Humanas. Eu seria um tolo se dissesse que a Física apenas trouxe infortúnios como a Bomba Atômica, a Química o Napalm e a Matemática os professores da rede de Ensino Médio. Primeiro por que graças à estas três ciências é que eu posso agora digitar estas palavras no meu blog, confortavelmente sentado em minha poltrona.

Mas existe um terceiro ramo da ciência, que atualmente anda meio desacreditado. Ele tem muitos nomes, mas o chamarei de Ciências Místicas. Grosso modo, são as ciências (de sciencia, saber e conhecimento em latim) que estudam aquilo que está além do mundo material, a alma, a natureza de Deus e a natureza divina do ser humano. Mais do que desacreditada, a Ciência Mística está em conflito aberto com a Ciência Exata, e em menor grau, com a Ciência Humana.

Muitos físicos, químicos e matemáticos são paradoxalmente ateus praticantes: não só acreditam como tentam arrebanhar (in)fiéis. E é difícil não se converter para a Sociedade da Terra Redonda, tendo em vista as maravilhosas conquistas da ciência cética. O que a religião trouxe de bom, de palpável para nossa civilização? Guerras santas e dogmas imprestáveis, majoritariamente. O ceticismo e o materialismo estão derrotando a fé e a espiritualidade. Mas então, por que é tão fácil encontrar um ex-físico que largou toda sua promissora carreira no mundo acadêmico pesquisando sobre glúons e leptons para ser monge, seja budista ou beneditino, e tão difícil encontrar um ex-monge que largou tudo, renunciou a sua fé e virou ateu convicto? Até hoje, só sei de um caso, em que um ex-crente virou ateu e criou um blog chamado “Jesus, me chicoteia!” para avacalhar com a bíblia. E só (e eu tenho minhas reservas quanto à igreja de onde ele veio). São casos anedotais que conheço, não representam a média da população e portanto não podem ser generalizados, mas levantam a dúvida mesmo assim: por que, apesar de tanto progresso material, por que ainda nos voltamos para o espiritual, especialmente em nossos tempos?

Deve ser exasperante para um Terra Redonda constatar isso. “É irracionalidade pura” diria um, pois tudo que a ciência materialista não pode explicar é irracional, e portanto não deve ser levado em conta. Nunca lhes passaria pela cabeça que há coisas além da ciência, pós-racionais. Talvez, as Ciências Exatas estejam chegando ao seu limite: há não muito tempo atrás, a teoria materialista de Newton foi posta abaixo, quando se descobriu que os átomos não estão presos uns aos outros como uma malha, mas estão dispersos, tão distantes uns dos outros como eu estou proporcionalmente distante do estádio Olímpico Monumental (OK, admito que não sei a proporção correta, mas é algo assim mesmo, longe pra burro). Entre eles, o vazio. E as partículas subatômicas ficam sumindo e aparecendo em outros lugares, como em locais construídos especialmente para serem simples vácuo. Como se explica isso de uma posição materialista? Baseado em meus conhecimentos de discussões científicas, há três possibilidades: faz-se uma explicação ad hoc, um ajambrado teórico feito especialmente para aquele caso; foge-se do assunto de maneira habilidosa; ou o materialista ataca a pessoa que fez a pergunta e a chama de obscurantista ou ignorante. Também há aqueles que explicam que “não é bem isso o que a teoria quis dizer”, e te provam através de sofismas que é justamente o contrário. Nenhuma dessas alternativas é uma resposta decente. Aliás, nenhuma delas é uma resposta.

Milênios de progressos científicos não refutaram ou destruíram a espiritualidade, a Ciência Mística como chamei no início do texto. Bem pelo contrário, agora a ciência confirma teorias espirituais de que o mundo não é tão real quanto imaginávamos, tão sólido quanto parece. Talvez as coisas em ciência aconteçam como William James acreditava: não importa quem tem o melhor discurso, por que a teoria mais verdadeira será triunfante no final*. Quem sabe estejamos vendo isto acontecer com as Ciências Exatas.





*Provem que o James velho-de-guerra está errado, pós-modernistas!

Treinos

Fui treinar Kung Fu hoje na academia. Demorei esta semana para fazer isto, graças à minha necessidade de ter que ir fazer uma observação de grupos na quarta-feira (que vai durar mais quatro semanas no mínimo), Psico 8 e ½ e outras pendengas. Mas valeu a pena.

Há três ou quatro anos, quando recém tinha começado a treinar em Caxias, conversei com um cara com mais tempo de treino, que me disse que “só fico satisfeito com o treino quando acordo dolorido no outro dia. Daí eu sei que eu me puxei”. Achei uma definição de produtividade bastante impactante, mas só em Porto Alegre desenvolvi um parâmetro próprio similar: para mim, treino bom é aquele que me faz voltar arrastando as pernas para casa. E ultimamente, apesar sentir que estou treinando menos do que deveria (e gostaria), tenho tido poucos treinos assim – não por falta de freqüência em aula, mas proporcionalmente. Alguns meses atrás, era batata ir para a academia e voltar quase morrendo. Agora, faço o treino completo e não me sinto tão fatigado (com exceções). Consigo até caminhar reto!

Outro parâmetro de produtividade pessoal que criei é o de formas praticadas, com pontos extras para aprender formas novas. E hoje foi um dia duplamente produtivo, pois além de sofrer para chegar em casa, foi-me ensinada a primeira parte completa da forma Louva-Deus, depois de um mês sem aprender nada de novo. É uma forma bem complicada, cheia de movimentos rápidos e estranhos (exatamente como um louva-deus), mas o que foi especialmente gratificante disso não foi apenas sua dificuldade, mas o tempo que levou para que me ensinassem. Senti-me próximo dos grandes guerreiros de antigamente, que levavam anos para aprender uma forma básica. O pai do Karatê-Do moderno passou 10 anos com um mesmo mestre para aprender apenas 3 katas (formas em japonês. Em chinês é katy). Dá uma média de 3 anos para cada, e os dias que ficaram de fora ele provavelmente ficou rachando lenha no mato (ou apanhando do mestre. Ou os dois. Ao mesmo tempo).

Para um bom preguiçoso, isso soa como masoquismo puro e simples, e só um abobado louco como eu se sujeitaria a tais condições. Mas a sensação de paz que sinto toda vez que entro no solo sagrado de treinamento, de deixar todos os meus problemas mundanos do lado de fora de suas paredes, de estar em harmonia comigo mesmo e com o universo mais do que supera a dor que às vezes sinto, mas dá sentido para ela. Os samurais antigos chamam esse estado mental de satori, os monges budistas de nirvana, e os psicólogos positivos de flow – fluir, pois não pensamos muito, apenas fluímos com a corrente, e cada passo dado em uma corrida, cada golpe desferido em uma luta, cada movimento em um katy é a única coisa que fazemos, a única que percebemos e a única com que nos importamos naquele momento. É uma meditação em movimento. O mundo cessa. É apenas um momento efêmero, mas que muitas vezes fez dias deprimentes que vivi tornarem-se subitamente iluminados. A dor é apenas uma plataforma para um crescimento pessoal maior, uma transcendência de si. Cada instante na academia é um instante bem aproveitado, e hoje mais do que muitos outros dias.