terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Formas de aprimorar o currículo de Psicologia da UFRGS

Em um excelente artigo, Lobo da Estepe faz uma lista de assuntos que ele gostaria de ver mais e de assuntos que ele gostaria de ver menos nas nossas aulas no Instituto de Psicologia. Pegando carona na idéia dele, vou fazer a minha lista de Vô/Não Vô coisas que eu gostaria de ver mais e gostaria de ver menos no nosso currículo:

Processos Psicológicos Básicos II - A cadeira de PPB I é boa e divertida, mas com conteúdo muito corrido e fragmentado. Poderia ser oferecida uma disciplina eletiva para os interessados em aprofundar-se nos conteúdos dados e aprender o que não pôde ser dado graças ao pouco tempo disponível.

Análise Experimental do Comportamento - Já tem uma eletiva disso, que eu fiz, gostei e aprendi muito. Entretanto, ficaram faltando algumas coisas, como prática em laboratório, e talvez um pouco mais de teoria, tanto skinneriana quanto de outros autores comportamentais.

Psicologia Cognitiva Comportamental - É atualmente o campo mais promissor da Psicologia, e por estudarmos em uma faculdade que tem um departamento inteiro dedicado à Psicanálise, nossas possibilidades de aprender sobre ela é bastante tolhido. Tal como Análise Experimental do Comportamento, há uma eletiva sobre o assunto, mas é da mesma forma insuficiente.

Psicologia Humanista e Existencial - Se algum colega meu ler isso, a primeira coisa que vai pensar é "mas esse merda não cansou de encher o saco dos professores até conseguir essa cadeira?" A resposta para esta pergunta é: não, não cansei. O que conseguimos com os professores foi uma disciplina introdutória, bastante superficial, apesar de abordar assuntos muito interessantes. Minha idéia é, a partir desta disciplina, conseguir outras mais específicas, de Abordagem Centrada-na-Pessoa, Fenomenologia, Psicologia do Ser, Daseinanálise, Logoterapia e Gestalt-Terapia, e talvez alguma disciplina como "Teorias Menores no Paradigma Humanistico-Existencial", que cubra outras linhas teóricas que não as maiores.

Psicologias Orientais - Pode parecer estranho pedir uma coisa dessas, mas o Ocidente ignora muitas técnicas e teorias desenvolvidas na China, Japão e Índia que podem ser consideradas como "Psicologia". Um bom exemplo é a Terapia de Morita e Naikan, além das técnicas de meditação zen budistas.

Etologia - Procurei essa disciplina na Biologia da UFRGS, e mesmo assim não encontrei. Considero de extrema importância esse assunto, pois nos ajuda a aprimorarmos nossas capacidades de observação (além de ficar procurando chistes e atos falhos).

Neurociências Cognitivas e do Comportamento e Informática - Esse é o campo mais promissor das ciências humanas e naturais. Primeiro porque é multidisciplinar, envolvendo desde psicólogos até lingüistas e técnicos de Informática. Segundo porque nunca antes na história deste país mundo tivemos uma tecnologia tão avançada para estudar o cérebro durante os comportamentos (encobertos ou não). Terceiro porque é do caralho, e quarto porque a psicanalistada não gosta. E não seria difícil conseguir umas disciplinas eletivas sobre esse assunto, considerando que temos neuropsicólogos no departamento de desenvolvimento e um programa de pós-graduação inteiro no Instituto de Ciências Básicas da Saúde (ICBS) dedicado a esse assunto.

Ciências Sociais - Pelo mesmo motivo do Lobo. E por que tô de saco cheio da Psicologia Social e Institucional.

Outras teorias em Psicanálise - Acabo de xingar psicanalistas e agora peço por mais Psicanálise? Qual é! Pode parecer contraditório, mas não considero esta linha tão aversiva assim. O que me enche o saco lá no Instituto é que só estudamos a Escola Francesa e os textos pré-históricos do Freud. Quem sabe ver algumas coisas diferentes não tornasse o departamento de psicanálise menos dogmático? Seriam eletivas

Psiquiatria - A Famed (Faculdade de Medicina) fica a no máximo 500 metros do nosso instituto, e mesmo assim não temos nenhuma aula com psiquiátras ou sobre psiquiatria. Isso já é uma idiotice por si só, se considerarmos que, junto com eles, dividimos a tarefa da psicoterapia, mais ainda se levarmos em conta que grande parte dos autores que lemos em psicoterapia são psiquiátras.

Teorias de Discípulos Rebeldes do Freud - Quem sabe não tenha algo de interessante na Psicologia Individual do Adler ou na Psicologia Analítica do Jung? Eletivas dedicadas a cada uma dessas teorias enriqueceria nosso currículo.

Mais Filosofia - A Psicologia está intimamente ligada com a Filosofia, e só temos três disciplinas filosóficas (Filosofia e Psicologia, História da Psicologia e Pesquisa em Psicologia). Umas eletivas a mais vinham a calhar.

Mais tempo de biblioteca - Por que eu quero pesquisar sobre outros assuntos, pô!

Mais tempo de DAP - Por que não gostamos de matar aula para ficar coçando no DAP. Seria bom não ter aquela sensação de quase culpa quando saio da aula e vou me jogar no bom e velho sofá azul.

E o que poderia ter menos:

Freud - Os motivos do Lobo são bons, mas tenho outros argumentos. Enquanto Freud é provavelmente o autor mais influente na história da Psicologia e da Psiquiatria, ele está ultrapassado em muitos aspectos. Não é necessário estudar tanto a obra do cara.

Lacan - Pelos mesmos motivos do Lobo e mais alguns, que prefiro não mencionar.

Guattarices - Guattari é um dos autores preferidos do Departamento de psicologia social e um dos mais enrolados e prolixos. É a perfeita imagem da Psicologia Social no Brasil: enroladora, alienada e descomprometida com a questão social verdadeira. Chega desse cara na faculdade, por favor, ou me mostrem um livro bom dele (eu espero sentado).

Menos tempo de aula - Por que eu quero pesquisar sobre outros assuntos, pô!(2) E porque eu quero mais tempo para treinar.

Bem, acho que era isso. Para os que acharam esta lista tendenciosa, por acaso vocês achavam que eu ia lamber o saco do Guattari*?

*Sim, eu iria. Quero fazer uma eletiva de Esquizoanálise não sei porque.

As Três Forças da Psicologia


Historicamente, a Psicologia nunca foi uma ciência unida, mas vários grupos de pesquisa com ideais epistemológicos e lógicas diferentes, estudando o mesmo assunto de maneiras muito diversas, quando não antagônicas.

São vários movimentos distintos, mas é possível agrupá-los em três grandes correntes, uma para cada ponta da letra grega Psi, de acordo com suas histórias e pressupostos filosóficos: Psicoanalítica, Comportamentalista, Humanista-Existencial.

As teorias e preceitos filosóficos por trás da Corrente Psicoanalítica* foran concebidas por vários filósofos, entre eles Platão, ao longo da história, mas foi só com Sigmund Freud que ela ganhou corpo e influência, quando ele desenvolveu a técnica da Psicanálise. Segundo a teoria freudiana, o ser humano não é completamenta racional e consciente, pois grande parte de suas ações são determinadas pela parte inconsciente e instintual da mente, e para uma vida mentalmente saudável, é necessário integrar a parte inconsciente com a parte consciente. Geralmente, as teorias psicoanalíticas consideram o ser humano uma criatura anti-social e egoísta, que vive com outros seres humanos para sobreviver. A Corrente Psicoanalítica não consiste apenas das diversas teorias dentro da própria Psicanálise, como a escola freudiana clássica, da Melanie Klein, de Lacan, Bion e outros, mas teorias concorrentes criadas por discípulos rebeldes de Freud, como a Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung, a Psicologia Individual de Alfred Adler, a Orgonômia de Wilhelm Reich, a teoria do apego de John Bowlby, as Etapas do Desenvolvimento de Erik Erikson e a Terapia Psicodinâmica. Esta corrente, apesar de ser historicamente a mais influente no campo da Psicologia, é a mais avessa ao método científico, pois muitas destas correntes apenas seguem as idéias de seus mestres, sem testá-las ou pô-las em dúvida. Além disso, suas teorias são geralmente do tipo "ou é isto ou não é", sendo sempre capazes de aceitar qualquer tipo de evento. Isto para a ciência não é algo desejável, pois seu objetivo é prever e controlar.

A Corrente Comportamentalista considera tudo o que seres humanos e organismos vivos fazem - ações, emoções e pensamentos - como comportamentos, e prefere explicá-los de forma científica independente da Fisiologia ou de construtos hipotéticos como a mente. Para evitar o dualismo, comportamentos encobertos, como pensamentos, não são considerados diferentes dos comportamentos visíveis. Esta corrente é a mais fiel ao método científico, por causa de seu enfoque em eventos observáveis ou passíveis de inferência segura. O precursor da Psicologia Comportamental foi Ivan Pavlov, que estudou o condicionamento do comportamento clássico com cachorros. John B. Watson foi o pai do Comportamentalismo norte-americano (Behaviorism), e o B. F. Skinner, maior teórico dos EUA nesta área, que desenvolveu a teoria do Condicionamento Operante através de suas pesquisas com ratos e pombos (além de outros animais, que foram utilizados por ele e por outros pesquisadores), e propôs o Behaviorismo Radical como filosofia a sustentar as Ciências do Comportamento.

Esta corrente pode ainda ser subdivida em três ondas de terapia, cujas técnicas são influenciadas pelas descobertas recentes: a Primeira Onda foi a Psicologia Comportamental clássica, representada pela Análise Experimental do Comportamento de B. F. Skinner, que focava-se exclusivamente no condicionamento e alteração de comportamentos indesejáveis; a Segunda Onda foi a Psicologia Cognitivo-Comportamental, representada pela Psicologia Cognitiva de Aaron Beck, que mantêm o foco em alterar comportamentos indesejáveis, mas dá maior enfoque para mudar pensamentos prejudiciais, ao contrário da onda anterior, que considerava que pensamentos e emoções não afetavam os comportamentos externos; e a Terceira Onda, representada pela Acceptance and Commitment Therapy (ACT) de Steven Hayes, que absorveu as práticas das ondas anteriores, e passou a utilizar técnicas antes ignoradas pelos terapeutas, como meditação e 'mindfulness' (mente cheia).

A terceira corrente, também conhecida como Psicologia da Terceira Força, é a Corrente Humanista-Existencial. Baseado nas obras dos filósofos Soren Kierkegaard, Nietzsche, Sartre e principalmente Heidegger e na Fenomenologia, esta corrente tem pressupostos básicos muito diferentes das outras duas. James Bugental resumiu a epistemologia humanista-existencial em 5 postulados:
1. O ser humano não pode ser reduzido ao seus componentes;
2. O ser humano possui dentro de si um contexto humano ímpar;
3. A consciência humana possui uma percepção (awareness) de si mesmo e do contexto dos outros;
4. O ser humano tem escolhas e responsabilidades não desejadas;
5. O ser humano tem intenção própria, e busca sentido, valor e criatividade;

Eu ainda adicionaria um sexto postulado, de que o ser humano tende para a bondade, e um sétimo, que a natureza humana transcende os aspectos biológicos e sociais, diferentemente das outras duas correntes, que dão maior ênfase para os aspectos biológicos, ambientais-sociais e hedonistas das pessoas. A Corrente Humanista-Existencial foi lançada como a Psicologia da Terceira Força na década de 1950, pelo psicólogo Abraham Maslow, como uma reação à Psicologia da Primeira Força, e à Psicologia da Segunda Força, o Behaviorismo, que focavam-se apenas em alguns aspectos da personalidade (como o inconsciente e os comportamentos condicionados), e negligenciavam aspectos centrais do ser humano: personalidade, auto-atualização, saúde, esperança, amor, criatividade, natureza, ser, vir a ser, individualidade e sentido, ou seja, o que realmente significa ser uma pessoa. As principais linhas teóricas desta corrente são a Psicologia do Ser de Abraham Maslow, a Abordagem Centrada-na-Pessoa (ACP) de Carl Rogers, a Gestalt-Terapia de Frederick Perls, a Psicanálise Humanista de Erich Fromm, a Daseinanálise ou Análise Existencial de Martin Heidegger, a Psicoterapia Existencial de Rollo May e a Logoterapia de Viktor Frankl; os quatro primeiros sendo humanistas e os dois últimos existencialistas. Existe ainda a Psicologia Transpessoal, também chamada de Psicologia da Quarta Força, que vem a ser um desenvolvimento da Psicologia Humanista.
Divido esta corrente em duas por que, apesar de compartilharem dos mesmos pressupostos filosóficos, ainda existem diferenças substanciais. Os Existencialistas tem grande parte de suas origens na cultura européia, e portanto, são mais pessimistas e dão maior ênfase para os aspectos negativos da existência, como a solidão existencial e a náusea de existir. Já os humanistas são em sua maioria americanos (tanto do norte quanto do sul), e preocupam-se mais com aspectos do crescimento positivo, como a auto-atualização (desenvolvimento como ser humano), capacidade conviver em harmonia com os outros, motivação e o que o ser humano pode se tornar (devir ou vir a ser).
Na questão científica, esta corrente é um pouco mais ambígua do que as outras duas. De fato, são utilizadas as técnicas de pesquisa fenomenológica, qualitativas por natureza, e que se focam em condições internas do ser humano, como pensamentos e emoções. A Fenomenologia é bastante rigorosa, sendo considerada por muitos como sendo a metodologia por excelência para as ciências humanas, mas por não dispor de meios de quantificar as suas descobertas, e por se utilizar da introspecção como método de pesquisa, sua validade é posta em dúvida por muitos outros críticos.

Mas a coisa não é tão simples como esta divisão pode fazer parecer, pois cada corrente influenciou a outra, e mesmo dentro da mesma corrente há diferenças cruciais. Por exemplo, Viktor Frankl estudou Psicanálise e Psicologia Individual no começo de sua carreira como psiquiátra, e mais tarde em sua teoria logoterapêutica postulou a existência de um insconsciente espiritual no ser humano, e a Análise Experimental do Comportamento considera as pessoas como meras "bolas de bilhar", que precisam de um impulso exterior para realizarem qualquer comportamento, enquanto a Psicologia Cognitiva já aceita a existência da vontade, ou a auto-determinação do indivíduo, entre outras desavenças epistemológicas menores. Além disso, alguns teóricos são educados na filosofia e nas técnicas de uma corrente, mas desenvolvem conceitos diferentes demais, como no caso de Erich Fromm, que apesar de ser psicanalista de carteirinha, desenvolveu a teoria da Psicanálise Humanista (que tem mais de humanista do que de psicanálise), e há casos como o da Esquizoanálise, que foi influenciada tanto pela Psicanálise como pela Daseinanálise.
Nenhuma das três correntes é superior às outras; se assim fosse, já teria sido decidido qual caminho tomar. Todas as três abordam fatores importantes da natureza humana: os comportamentos inconscientes, os comportamentos observáveis ou inferíveis e a potencialidade e motivações, e todas as três podem cair em reducionismos imbecis, que só atrapalham o progresso científico. Ainda assim, seguidores e teóricos de todos os matizes lutam por supremacia como num jogo de xadrez, pois tem certeza de serem melhores que os outros, e plenamente capazes de "explicar tudo" em nosso mundo.
Para melhor compreendermos o ser humano, devemos levar em conta todos os aspectos levantados e pesquisados por estas correntes, de maneira integrada entre elas e com outras ciências que estudam o Homo Sapiens, como a Biologia, representada pelas Neurociências, a Genética e a Bioquímica, e as Ciências Sociais, representada pela Sociologia, Antropologia e Ciências Políticas. Devemos estudar e levar sempre em conta que o ser humano é determinado por forças biológicas, sociais e psicológicas, e que mesmo assim ele é capaz de transcender todas estas forças. Caso contrário, estaremos sempre correndo atrás do nosso próprio rabo, e caíremos em simplificações perigosas de nossa própria natureza.

Uma vez, para sempre

Participei do movimento escoteiro por 9 anos. Fui lobinho, escoteiro, sênior e por um curto período, pioneiro. Nos últimos meses, não tinha mais paciência para o tipo de atividade que estava acontecendo, e por isso, o fato de estar estudando e morando em outra cidade e por causas outras decidi me afastar no início do ano passado. Entretanto, por muito tempo, fiz valer e valeu a pena ser uma criança vestida de rídiculo comandada por um ridículo vestido de criança. Durante o Ensino Médio, os sábados de tarde nos pavilhões eram o único dia da semana em que me sentia tranqüilo, com amigos.

Desde que saí, não tive muito contato com esse pessoal, tirando eventuais festas e encontros informais por aí. Sinto falta daquele bando de monstros, e também sinto falta dos acampamentos, do cheiro de mato e fumaça, das piadas de mau gosto contextuais altamente nonsense e de se matar trabalhando ou correndo ou fazendo qualquer outra coisa doente por aí (fazer coisas doentes era nossa especialidade).

Foi nos escoteiros que o nome Andarilho surgiu pela primeira vez, durante uma jornada, onde todos estavam caminhando em grupos distintos, menos eu, que andava sozinho, tal e qual um andarilho.

Marcamos um acampamento para dia 22. Vamos ver no que vai dar isso.