quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Trabalho de Psicologia e Educação

Enfim, terminei o último trabalho de Psicologia e Educação, e já posso dizer que tenho uma cadeira a menos para me preocupar, apesar de ainda ter que freqüentar as aulas e participar das discussões. Em todo caso, estou um tanto quanto preocupado com a qualidade do meu trabalho. Por isso, posto ele aqui para apreciação crítica de meus amigos:

Questões Relevantes sobre Psicologia e Educação

Antes de começar meu trabalho propriamente dito, gostaria de esclarecer alguns pontos em relação à maneira como ele foi escrito. Ao invés de apresentar/discutir duas questões que considerei relevantes/importantes em cada texto, justificando sua importância e apresentar que posturas assumiria ao trabalhar no campo da Educação ,como foi explicitado pela professora, preferi elaborar duas questões gerais e abrangentes, e tentar respondê-las de acordo com o que acredito ser o correto no momento, usando a bibliografia a minha disposição como fundamentação teórica para meus posicionamentos.

Como estudante de Psicologia, acredito que, por mais pragmáticos que devemos ser em nosso campo de atuação, não podemos nunca abandonar os questionamentos epistemológicos sobre nossas práticas. Portanto, antes de pormos em andamento qualquer programa educacional, devemos ser capazes de responder as seguintes perguntas:

1) Qual é o papel da Educação?
2) Que função a Psicologia exerce no contexto educacional?

Como um complemento à primeira questão, também deve-se perguntar:

1.1) A Educação cumpre seu papel de forma satisfatória?

Por serem por demais amplas, não existem respostas únicas e corretas para estas duas questões. Existem formas idiossincráticas de responder, baseadas em crenças e experiências pessoais, que são determinados pelo tempo e local em que estão circunscritas. Apresentarei neste artigo a maneira como eu vejo as coisas, e as posturas éticas que acredito que adotaria se trabalhasse na Educação, e estão sujeitas a mudarem futuramente, pois, conforme o tempo passa, não só a sociedade e suas concepções científicas que mudam, como também nós vamos transformando nossas formas de ser (Bock, 2000).

Acredito que o papel da Educação é muito complexo, além de ser muito importante. Gosto muito da definição dada por Ghiraldelli Jr. (2000) das influências existencialistas da obra de Freire, que a educação deve permitir que o homem deixe de ser objeto e torne-se sujeito de sua própria história, pois ao mesmo tempo em que define o indivíduo como ativo e capaz de mudar a si próprio e seu meio, não exclui as influências determinantes do ambiente, da cultura e da biologia. Tenho a firme convicção de que a educação e a humanidade como um todo só progredirão na medida em que forem capazes de ensinar ao indivíduo a serem mais conscientes de sua própria condição e a mudá-la. Um estudo realizado por Rogers (1980) e seus orientandos de pós-graduação abordou os fatores preditores de comportamento delinqüente em adolescentes. Foram feitas cuidadosas classificações objetivas do clima familiar, das experiências educacionais, das influencias da vizinhança e culturais, das experiências sociais, do histórico da saúde, do alicerce hereditário de cada participante e uma avaliação do grau de autocompreensão, incluída tardiamente. Surpreendentemente, o melhor prognosticador de comportamento futuro, com correlação de 0,84, foi justamente o grau de autocompreensão, enquanto que a qualidade da experiência social correlacionou 0,55. O estudo foi replicado tempos mais tarde, com outro grupo de sujeitos, e os resultados encontrados foram basicamente os mesmos. Creio que este estudo, além de dar suporte empírico para minha crença, também indica de forma clara como se pode alcançar este protagonismo através da educação, ajudando o estudante a ser mais autoconsciente.

Contudo, há de se questionar se a Educação, não só em sua modalidade formal, como também informal e não-formal (Gohn, 2006), atinge este objetivo e, se não for este o caso, questionar também por que assim ocorre. É difícil afirmar com confiança que as instituições de ensino (fundamental, médio e superior) falham completamente em ensinar aos indivíduos a serem “sujeitos de sua própria história”, primeiro por não dispor de dados específicos que aleguem isto; segundo, por que a educação neste paradigma não depende apenas da capacidade do professor e da instituição de ensinar, mas também da dedicação e vontade do estudante de aprender. Ainda assim, baseado em anedotas como os artigos de Heckert et al. (2001), Eizirik & Comerlato (2004) e, principalmente, na minha própria experiência, digo que o grau de sucessos é muito menor do que o de fracassos. O maior incentivo que existe dentro das salas de aula do ensino médio e fundamental é a necessidade de tirar boas notas para passar de ano e conhecer o conteúdo para passar no vestibular em uma boa faculdade. No ensino superior, devido a maior liberdade intelectual e prática oferecida aos seus estudantes (que já não podem ser taxados de crianças), penso que haja maior autoconsciência e capacidade de autodeterminação entre os estudantes, mas não creio que isto seja a regra. Mais uma vez, devo ressaltar aqui o caráter idiossincrático de minhas afirmações, e que tudo está aberto para investigações.

Resta saber qual papel nós, como psicólogos, cumprimos no processo educacional para que este objetivo possa ser alcançado. Cada vez mais a Psicologia se insere dentro da Educação. Segundo artigo de Meira (2000), uma pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Psicologia em 1992 constatou que a Educação é o terceiro maior campo de atuação profissional da Psicologia, com 24,4% do total de entrevistados, atrás apenas da clínica (37,2%) e organizacional (29,6%). Assim sendo, nossa classe está em posição privilegiada para influenciar o processo de aprendizagem-educação, seja fora das salas de aula, agindo “nos bastidores” e colocando nossos conhecimentos em prática, seja dentro da sala de aula, transmitindo este conhecimento. Porém, segundo Rocha (1999), a função que o psicólogo tem exercido dentro das escolas tem sido como um diagnosticador de deficiências de aprendizagem do aluno e/ou da metodologia utilizada pelo professor para desenvolvimento de suas atividades de classe. Rocha também identifica que os psicólogos que trabalham dentro de escolas dividem-se na maneira como definem seu modelo de atuação: alguns vinculam-se à categorização do psicólogo como profissional da saúde (modelo clínico), outros da cultura (modelo pedagógico), enquanto que um terceiro grupo define-se como adotando o modelo da análise institucional. Contudo, apesar das diferentes nomenclaturas, todos buscam essencialmente a mesma coisa: a adaptação dos indivíduos ao ambiente da escola e isto, creio eu, mesmo às custas do pensamento crítico e da autonomia estudantil. Permita-me exemplificar isto com uma experiência própria, vivida no meu terceiro ano do Ensino Médio. No último trimestre do ano letivo, estava me preparando para fazer intercâmbio estudantil nos Estados Unidos, e a burocracia envolvida era muito pesada. Precisava que a diretora de meu colégio assinasse um certo documento e, para pegá-la, aproveitei um dia em que, ao invés de aulas, ocorreria um simulado de vestibular oferecido por uma universidade gaúcha. Ao entrar no prédio, encontrei a coordenadora pedagógica, cuja formação básica suspeito ser Psicologia, e falei-lhe da minha situação. Ela me disse que teria que esperar e me levou para minha sala de aula, onde estava sendo aplicado o simulado. Não muito satisfeito com esta situação, saí da sala e, encontrando novamente a coordenadora, pedi mais uma vez para falar com a diretora. Ela ficou nervosa e disse que eu deveria estar fazendo “as coisas que realmente importam”, ao invés de ficar “correndo atrás de irrelevâncias como o intercâmbio” (também tive que ouvir a outra coordenadora pedagógica dizer que, se ela fosse minha mãe, estaria muito preocupada comigo!). Passados quase três anos desde o ocorrido, posso dizer com segurança que em seis meses morando no exterior aprendi mais do que os três anos que passei sentado nas carteiras da minha velha escola, e que aquele simulado não fez a menor diferença em minha vida!

Fazendo uma caricatura da situação, é provável que a maioria dos psicólogos que trabalhem na educação estejam muito mais preocupados em manter o status quo, a imagem pré-concebida da escola, do que em estimular verdadeiramente a autoconsciência e autonomia dos educandos, por mais que os projetos político-pedagógicos adotados por eles digam o contrário.

Tendo tudo isto em mente, o que pode ser feito para ajudar os psicólogos em formação a entenderem seu papel socrático na educação, de estimular os estudantes a conhecerem a si próprios, e, mais importante ainda, como sair do discurso e fazer isto na prática educacional? Lamento não ter nenhuma outra resposta além de sermos nós próprios autoconscientes de nossas próprias limitações, de nos policiarmos permanentemente (não no sentido foucaultiano!) para que não caiamos no erro de buscar apenas a adaptação ao meio, e sermos humildes para aceitarmos quando erramos. Acredito que colocar isto em prática é uma ferramenta pedagógica muito mais eficaz do que qualquer aula expositiva.

Referências

BOCK, A. B (2000). As influências do Barão de Münchhausen na psicologia da educação. In: TANAMACHI, E. R.; ROCHA, M. L. P. Psicologia e educação: desafios teóricos-práticos. São Paulo: Casa do Psicólogo. p. 11-34.

Eizirik, M. F.; Comerlato, D. (2004) A escola (in)visível: jogos de poder, saber e verdade. 2. ed. Porto Alegre: Editora da UFRGS.

GHIRALDELLI JR, P (2000). As concepções de infância e as teorias educacionais modernas e contemporâneas. In: Educação e Realidade: Os nomes da Infância. V 25 n.1. Porto Alegre: Rosa Maria Bueno Fischer.

GOHN, M. G. M (2006) Educação não-formal, participação da sociedade civil e estruturas colegiadas nas escolas. Avaliação e Políticas Públicas em Educação, Rio de Janeiro, v. 14, n. 50, p. 11-25.

Heckert, A. L.; Corona, C. R; Manzini, J. M. ; Machado, R. E.; Fardin, V. L. (2001) A Escola como Espaço de Invenção. In: Jacó-Vilela, A. M.; Cerezzo, A. C. e Rodrigues, H. B. C. (orgs). Clio-psyché hoje: fazeres e dizeres psi na história do Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará: FAPERJ.

Meira, M.E.M. (2000). Psicologia Escolar: Pensamento crítico e práticas profissionais. Em: E. de R. Tanamachi; M.L. da Rocha & Souza, M.P.R. (Orgs). Psicologia e Educação: desafios teórico-práticos. (pp. 35-72). São Paulo: Casa do Psicólogo.

Rocha, M. L. (1999) A formação na interface psicologia/educação: novos desafios. In: Jacó-Vilela, A. M.; Mancebo, D. (Org.). Psicologia social: abordagens sócio-históricas e desafios contemporâneos. Rio de Janeiro: Ed. UERJ.

Rogers, C. R. (1980) Duas Tendências Divergentes. In: May, R. (org): Psicologia Existencial (pp. 97-106). Porto Alegre: Globo.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Happy Birthday to me!

Hoje é meu aniversário! Vamos festejar, os amigos receber! É o meu aniversário! Bolo, guaraná, muito doce para mim! E coisas do gênero.

Pois é, hoje fiquei mais velho. Aliás, esta é uma forma engraçada de dizer. "Fiquei mais velho" legalmente, mas o que mudou de ontem, quando ainda tinha 19 anos e 394 dias, para hoje?

Aniversários são divertidos (tenho pelo menos 100 novos recados no meu orkut, me parabenizando por fazer algo que qualquer um faz), mas são, no final das contas, apenas uma data arbitrariamente escolhida para comemorar nossa sobrevivência.

Mas estou reduzindo demais as coisas e não estou fazendo sentido. Feliz aniversário para mim, e para todo mundo que nasceu no mesmo dia que eu.

Insight de Aniversário

Hoje é meu aniversário. Completo 20 anos neste dia. E, desde que entrei na faculdade, todos os meus aniversários foram "celebrados" em eventos acadêmicos. Ano passado, durante um congresso chatíssimo no Hospital de Clínicas de Porto Alegre sobre a humanização do SUS (não que o assunto não seja interessante - o congresso é que foi um porre). Hoje, acordei e fui para uma reunião sobre estágios básicos.

Ao contrário do ano passado, hoje tive um importante insight: próximo semestre meus estágios começam. Eu já sabia disto intelectualmente, mas o peso deste conhecimento não tinha me atingido verdadeiramente até hoje, quando suas conseqüências ficaram finalmente claras para mim.

Começar meus estágios no próximo semestre significa que finalmente começarei a trabalhar de verdade (além da bolsa de iniciação científica), e que preciso, a partir de agora, começar a procurar um local onde estagiar. Nesta mesma reunião foram apresentados vários locais diferentes, entre os quais alguns me interessaram bastante, de especial maneira o próprio Hospital de Clínicas. Contudo, há poucas vagas lá, e talvez eu tenha que me contentar em estagiar em outro lugar. Assim, recomeça meu esforço metaético de decidir o que quero me tornar, escolhendo onde quero aprender a trabalhar, sem saber exatamente o que acontecerá comigo e como isto me influenciará.

sábado, 25 de outubro de 2008

Da Economia ao Espírito

Quem me conhece pode dizer que sou estatisticamente estranho - a maioria de meus comportamentos não se encaixam na média ou moda geral. Eu sou o que poderia se chamar de excêntrico, ou até mesmo subversivo. Sei que após o fim da ditadura e com o florescer da democracia no Brasil subversivo virou um adjetivo elogioso, e até desejável. Em outros termos, ser subversivo é a regra. Por isso, acho um tanto quanto suspeito quando alguém diz que algo é subversivo como se fosse a coisa mais maravilhosa do mundo e hesito em usá-la. Ainda assim, devo admitir que sou subversivo, justamente por que não o quero ser. Quase um koan budista isto.

Feita esta pequena introdução, gostaria de falar sobre o que me levou a escrever este post. Por causa da faculdade e todos os seus trabalhos, textos e festas idas à biblioteca, tornei-me um alienado em relação aos acontecimentos atuais, tanto do Brasil, quanto do mundo, e fico sabendo apenas do que é realmente importante, como o caso Isabella, o caso Eloá, o nariz da Amy Whitehouse, e a maior crise econômica desde 1929 que assola o mundo justamente durante a campanha presidencial dos Estados Unidos da América, os donos do mundo. Desde que me conheço por gente, o esporte da maioria das pessoas cultas é criticar os EUA. Professores de ciências humanas e humanidades, como sociologia, filosofia, história, geografia e psicologia, tanto do ensino fundamental até a pós-graduação são os campeões neste esporte, não só na prática em si quanto em sua popularização, doutrinando muitos e muitos de seus aluninhos a falarem da mesma forma que eles. Obviamente, eu fui um destes aluninhos.

OK, OK, não é tão difícil assim convencer alguém que os gringos fizeram muita porcaria por este mundo. Para ficar apenas nos exemplos recentes, eu cito a II Guerra do Golfo, a Guerra do Afeganistão e as intervenções militares indiretas na América do Sul para eliminar plantações de coca. Eu poderia também descambar para a teoria da conspiração e dizer que JEWS DID 9/11!!! o governo estadounidense planejou o 11 de setembro, mas eu não comprei esta história como aceitável. Ainda assim, o mero fato de cidadãos dos EUA duvidarem da honestidade de seu próprio governo neste nível é um sinal claro de que, sim, é bem fácil pensar que os EUA são bandidos, sem contar todos os outros exemplos que deixei de fora. Não é algo realmente surpreendente que nós, brasileiros bem educados, bem alimentados e bem informados critiquemos os EUA, e repudiemos suas políticas. Mas, obviamente, eu não vou terminar este texto dizendo algo como "os EUA são maus, muito maus", nem "os EUA vão salvar o mundo destes comunistas", e é aqui que começa a parte subversiva do texto.

Na verdade, por mais que ache justificadas as críticas, elas quase sempre soam aos meus ouvidos como hipocrisia, por serem muito mais chutar o cachorro morto do que argumentos fundamentados logicamente. Eu e meus colegas teorizamos que pode-se deduzir que alguém vai falar bobagem pela forma como começa sua frase. Por exemplo, nada de bom pode vir depois de "primeiro, a gente compra um Del Rey"; nada de bom pode vir depois de "a gente fala com uns agricultor"; e nada de bom pode vir depois de um "ah, por que o Bush..." dito em uma sala de aula. Dificilmente será algo acima do pastiche senso comum que circula pelos meios "iluminados intelectualmente" aqui no Brasil. Certamente, Bush Jr. foi um dos piores presidentes de todos os tempos, competindo até com o infame James Buchanan, que permitiu a Guerra Civil nos EUA. Mas não há nada melhor para se dizer sobre ele? Nada além disso? Se não houver, por que não podemos considerar isto como consensual e seguir em frente? Pelo jeito não, pois nunca antes na história deste país apareceu um cachorro morto tão bom para se chutar.

Mas o movimento anti-EUA não se restringe a criticar as guerras deles, as políticas deles ou os hábitos deles. Chega ao ódio gratuito. Lembro muito bem de, logo após ter entrado para a faculdade, de uma pessoa dizer que gostou de ver os EUA se se foder com os atentados ao World Trade Center, apesar de sentir tristeza pelas vítimas. Como se os EUA fossem governados por robôs sem coração (ou criaturas reptilianas do espaço), à parte de sua população. Fiquei especialmente chocado com esta afirmação por tê-la escutado poucos meses após minha estadia naquele país, onde morei por seis meses sob o mesmo teto que quatro outros estadounidenses. Como disse anteriormente, também fiz coro com todas estas pessoas que fazem de criticar os EUA seu esporte, mas morar lá me fez mudar muitas, se não todas, idéias que tinha anteriormente.

Fim de semana passado aconteceu aquilo que posso considerar o gatilho deste post. Estava com meus amigos dos escoteiros ao redor de uma fogueira, e conversávamos sobre os mais diversos assuntos. Na maior parte do tempo, foram assuntos que pouco me interessam, como futebol e carros. Mas em um certo momento, passou-se a comentar sobre o quadro político atual, e eu, apesar de temporariamente alienado, ainda me interesso por este tipo de conversa, e até mesmo acho que sei alguma coisa a respeito! O foco da conversa foi direcionado para as eleições presidenciais estadounidenses, e seus candidatos, Barrack Obama e John McCain. Havia como que um consenso entre os presentes que o melhor dos dois é Obama. Um amigo meu verbalizou isto de forma bem clara tornando-se o porta-voz do grupo segundo Pichon-Riviere, e depois acrescentou "mas eu quero mesmo é que o McCain ganhe, por que eu odeio os EUA e quero que eles se fodam". Não houve muitos protestos contra esta afirmação, aliás, não houve nenhum. Isto também era um consenso do grupo!

Apesar de impactante, esta afirmação não causou um efeito imediato em mim, mas ficou como que incomodando minha mente, fazendo idéias pipocarem de vez em quando, até este momento, quando tornou-se insuportável não escrever nada a respeito. De qualquer maneira que posso imaginar, estamos indissoluvelmente ligados aos EUA, gostemos ou não. De um ponto de vista estritamente materialista, eles são o motor econômico do mundo, que gastam mais do que ganham e assim fazem as mercadorias e o dinheiro circularem; eles são um dos países mais tecnologicamente desenvolvidos do mundo, investindo pesadamente em pesquisas sem precedentes*, tanto básicas quanto aplicadas; e eles são os maiores exportadores de cultura, influenciando o mundo inteiro com seus hábitos, seja isto bom ou ruim. Desejar o mal para os EUA economicamente é desejar o mal para si próprio! Se não acredita em mim, apenas leia os jornais ou livros de história, e veja que há uma alta relação causal entre crise nos EUA e crise no resto do mundo.

De um ponto de vista filosófico, religioso, espiritual, esta afirmação ganha ainda mais peso, pois não são apenas nossas ações na BOVESPA que estão em jogo, mas nossas próprias existências e almas. Em diversos lugares do mundo, em diferentes épocas, pessoas chegaram a conclusão de que todos nós estamos ligados a todos os outros, e que todo mal que causamos sempre volta para nós. Jesus disse que aquilo que fazemos aos outros, no fim fazemos a ele. Jesus tinha chegado à esta mesma conclusão. Estamos ligados uns aos outros, e ainda assim, continuamos a nos prejudicar mutuamente. Seremos cegos?





* Não quer dizer que todas estas pesquisas sem precedentes sejam todas úteis, mas são inovadoras ainda assim. Antes de pesquisar, ninguém sabia que fotos da Paris Hilton acalmavam ratos de laboratório. O mesmo é válido para a regulação hormonal do organismo e para a energia nuclear.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Vida Dura (Parte 19)

Sabem aquele programa “Mythbusters”, onde uma equipe de malucos chefiada por dois caras ainda mais malucos inventam experimentos absurdos para falsear lendas urbanas? Pois é, me senti fazendo o mesmo que eles hoje antes do almoço.

Eu moro do lado do Restaurante Universitário. É uma posição muito estratégica e positiva, que me permite almoçar a preço de banana quando eu bem entender. Como hoje o cardápio era bife com molho, decidi ficar em casa e comer um congelado. Peguei um calzone no congelador, coloquei num pirex de vidro (atentem para esta parte) e coloquei no forno. Quando ficou pronto, tirei do forno, coloquei meu calzone num prato e larguei o pirex na pia. Não satisfeito com isto, resolvi encher o pirex com água fria.

Eu sempre faço isso. Desde criancinha eu gosto de pegar a torradeira ainda quente e colocar debaixo da torneira para ouvir o barulho da evaporação súbita. Babaca e infantil, eu sei, mas muito divertido. O que mudou hoje, que me motivou a escrever um post a respeito, foi a quantidade de água envolvida na brincadeira e o fato do vidro ser termodinamicamente diferente dos metais. Coloquei o pirex na beira da pia, posicionei a torneira na melhor (ou seria a pior?) posição e abri a corrente. O barulhinho do “tshhh” era hipnotizante, e mantive a torneira aberta, enchendo tanto quanto fosse possível o pequeno recipiente, até que BLAM! Ele explodiu, arremessando caquinhos de vidro por toda a cozinha.

Sim, foi o choque térmico. Qualquer calouro de Física poderia dizer que essa foi uma idéia de arigó, pois por causa do resfriamento súbito, o material contrairia demais e trincaria. Deste ponto de vista, o pirex não explodiu, mas implodiu com muita violência, mas para todos os efeitos foi uma bela merda. Por sorte, o pirex só estourou para os lados, pegando apenas na minha camiseta, que me protegeu contra qualquer ferimento.

Minha primeira reação, ao ver toda a destruição que causei foi gritar “UHUUL! QUE MERDA EU FIZ?” É, ambivalente assim mesmo. Foi extremamente divertido brincar de cientista maluco, mas também foi extremamente encagaçante. Vidro voando para todo o lado tem esse poder. O experimento estava concluído, e as hipóteses testadas. Mas, ao contrário dos Mythbusters, eu não tenho uma equipe nos bastidores esperando a gravação terminar para limpar todo o estúdio. Pra começo de conversa, não tenho nem uma câmera para filmar nada, e meu estúdio é minha cozinha. De algum jeito eu teria que limpar aquela bagunça. Eu poderia ter deixado tudo como estava, escrever um bilhete dizendo “Surpresa, mãe!” e deixar lá. Só que, se fizesse isso, minha querida mãe me daria uma surra, a primeira em 19 anos de vida. Sim, ela me surraria. Por isso, fiz questão de ligar para ela e dizer “tenho uma boa e uma má notícia. A boa notícia é que eu sei muito mais sobre Física agora. A má notícia é que eu estourei um pirex e enchi a cozinha com caco de vidro no processo”. Uma bela merda. Catei tudo o que consegui por conta própria e deixei para minha mãe a limpeza final, mais refinada.

A hipótese testada foi: o Andarilho sabe o que faz? Conclusão: não sabe porra nenhuma. É impressionante que ele ainda esteja vivo com este cérebro.

A Volta do Filho Pródigo

Este final de semana, dei uma passada no meu antigo grupo de escoteiros. Tinha falado com um amigo meu que ainda participa, e resolvi aparecer para a atividade deste sábado.

Depois do almoço, peguei o ônibus linha Pioneiro, que vai até os Pavilhões da Festa da Uva, e ao chegar à sede, entrei direto na sala do Clã Pioneiro. Passei quase a tarde inteira sentado escutando os outros falarem. Mas, depois que a atividade acabou, fui junto com os outros para a chácara de um amigo, onde a tropa sênior estava acampando. Neste mesmo local passei muitos finais de semana divertidos, comendo porcarias, dizendo besteiras, nadando na piscina e construindo pioneirias. A partir do momento que me disseram que iríamos para lá, sabia que a minha pequena visita se tornaria uma viagem ao meu selvagem passado sênior.

Para ser sincero, não esperava que fosse uma experiência prazerosa. Achava que tanto tempo distante de todo aquela atmosfera me mudara demais para poder apreciá-la da mesma forma, e que eu não teria o que falar com meus amigos, que estão envolvidos com coisas muito diferentes do que eu. Em parte, estava certo: com certeza, não tive a mesma sensação que costumava ter ao ver aquela piscina suja e entrar naquele mato embarrado, e meus amigos achavam mais interessante falar sobre futebol e carros do que política e genética. Mas, ainda assim, foi muito bom ter ido.

Obviamente, o cheiro de fumaça ainda é o mesmo, mas eu o sinto de forma diferente agora, depois de quase dois anos morando e estudando em Porto Alegre, numa instituição de ensino superior considerada de excelência. Geralmente eu evitaria esta definição, mas o fato é que minha vida de dedicação exclusiva aos estudos me diferenciou bastante dos meus amigos, que estão mais preocupados em trabalhar e ganhar dinheiro. Não que eles não estudem nada, mas isto é meramente secundário para eles, enquanto que para mim isto é central.

Mesmo assim, senti-me em casa. Todo ex-escoteiro acaba um dia voltando para seu grupo, por um dia que seja. Fiz isto esse sábado. Visitei os cantos das patrulhas, elogiei sua organização e suas pioneirias. Acredito que fui o primeiro ex-sênior em muito tempo (se não o primeiro de todos) que, ao invés de criticar e reclamar da deterioração da tropa depois que saiu, elogiou e disse que eles estavam mais bem preparados do que eu estava na minha época. Acho que isto os animou (se algum veterano de tropa meu dissesse isso, eu certamente ficaria animado).

Mas apesar de achar que eles estão muito bem, ainda fiquei surpreso de vê-los por lá, sendo seniores. Cacete, quando eu era sênior aquela gurizada só ficava tirando ranho do nariz e brincando! Como podem agora estar montando torres de sinalização e trabalhando noites inteiras? Acho que só posso dizer que o tempo não pára, e as coisas sempre estão mudando. Eu, por exemplo, durante meus tempos de escoteiro nunca me imaginara largando o grupo para estudar em Porto Alegre. Aliás, eu achava que continuaria no movimento ad eternum, e seria pioneiro e chefe. Doce ilusão. Mal cheguei aos pioneiros e saí. Olhando para trás agora, posso dizer que foi uma decisão acertada. Contudo, durante a levemente chata reunião da tarde, ouvindo o que meus amigos fazem agora como pioneiros, pude ver que não teria sido uma má idéia continuar no movimento, pois são atividades realmente enriquecedoras. Isto me entristeceu um pouco, pois deixei para trás um pedaço importante da minha vida quando saí em definitivo, e fiquei com a sensação de ter perdido muita coisa. Claro, quem diz isto sou eu, Andarilho, depois de passar por muitas outras experiências fantásticas que me deram uma visão mais ampla da vida, visão que, talvez, eu não teria agora caso tivesse escolhido ficar em Caxias. Mas isto é pura especulação, e nunca saberei ao certo.

Mesmo as situações quem mais deixaram claro o meu distanciamento foram divertidas. As mais marcantes ocorreram quase em seqüência. Comecei a discutir sobre implicações éticas e filosóficas das pesquisas em genética e ser interrompido pelos demais, que se sentiam perdidos, para depois dar vexame por não conseguir rachar um pedaço de lenha a machadadas. Tornei-me um intelectual. Por um lado isto me agrada, e por outro me irrita. Não quero passar o resto da minha vida apenas discutindo: eu quero fazer! E para isto o escotismo me proporcionava grande número de oportunidades.

Pensando um pouco na minha carreira escoteira, posso dizer que fui esforçado. Não era particularmente brilhante ou adepto em fazer as coisas, mas minha persistência e força de vontade me colocavam de igual para igual com meus colegas mais fortes e habilidosos. Nunca fui o melhor em fazer amarras, nem em cozinhar ou em qualquer outra habilidade campeira (exceto em pagar flexões e competir em aventuras, que eram meu motivo de maior alegria e são agora motivo de maior nostalgia). Fui, contudo, suficientemente bom em todas elas.

Bem, acabei escrevendo um texto um tanto quanto desconexo e piegas, mas bastante honesto. Para concluí-lo, devo dizer que não voltarei para o meu grupo, não neste meu momento existencial atual. Porém, certamente aparecerei mais vezes na sede do velho Grupo Escoteiro Moacara, e me encontrarei mais com aquelas pessoas que tanto fizeram por mim, sejam meus ex-colegas, sejam meus chefes. De uma forma ou de outra, eles fazem parte do que sou hoje.

sábado, 18 de outubro de 2008

O Monstro de Sete Cabeças da Política Estudantil

Desde que entrei na UFRGS, minha relação com a política do movimento estudantil foi bastante ambígua. Se, por um lado, eu sempre tive vontade de participar ativamente na construção de uma universidade melhor, por outro fui levado a desconfiar bastante de quem se envolve em órgãos deliberativos estudantis, em especial maneira o Diretório Central dos Estudantes (DCE).

De certa forma, sou um produto típico do meu curso, pois a Psicologia é politicamente estranha e até mesmo alienada, pois ao mesmo tempo que somos conclamados a participarmos de movimentos como a Reforma Psiquiátrica e o boicote à Lei do Ato Médico, ninguém dá a mínima para o que acontece no Campus do Vale, ou até mesmo nas unidades vizinhas à nossa se isto não interfere de forma direta nos nossos próprios interesses. Estou sendo injusto ao dizer que ninguém dá a mínima para o que acontece no resto da Universidade. Mas o que observei ao longo de quase dois anos estudando ali é que são muito poucos os casos de pessoas que fizeram algo concreto nesta direção. Geralmente, as energias de quem se interessa por este assunto são voltadas para nosso próprio Diretório Acadêmico da Psicologia (DAP). Eu próprio me incluo nesta categoria.

O DAP, ao contrário da maioria dos diretórios e centros acadêmicos é uma auto-gestão. Isto significa que não são feitas eleições anuais para decidir qual grupo (geralmente, patrocinado por algum partido político relativamente influente) irá representar os interesses estudantis, mas que não só o estudantes de psicologia da UFRGS, mas TODAS as pessoas que queiram se envolver, integram a sua administração, e têm direito a voz e voto, não importando se eles são membros do PT, do PSOL ou de partido algum, como ocorre em muitos outros lugares. Se todos os indivíduos ligados de alguma forma ao DAP fossem responsáveis e se envolvessem de forma satisfatória, este seria o modelo perfeito de gestão. Mas, como qualquer ser humano com mais de 10 anos e que já fez trabalhos escolares em grupo sabe, as coisas não funcionam assim, e o que quase sempre acontece é que um ou dois infelizes carregam o piano sozinhos, e os demais ficam apontando o que eles fazem de errado. Quem se importa com o que acontece no resto da UFRGS está ocupado demais com os problemas específicos da Psicologia, e quem não se importa não faz nada de qualquer maneira.

A própria ideologia da auto-gestão nos leva a ignorar as instâncias deliberativas mais amplas, principalmente o DCE. Pensamos que nosso modelo é o mais democrático possível e que qualquer outra forma de participação menos direta é perda de tempo. Um dinossauro do DAP falou em uma reunião que nunca se envolveu com o DCE por que não acredita no sistema de voto representativo e por que não queria ser manipulado por nenhum partidão.

Paradoxalmente, todas estas influências me levaram a concluir que devemos, sim, pelo menos uma vez entrar no jogo da eleição do DCE. Por eu ser um destes carregadores de piano, enfrentei as minhas próprias limitações e as de outros cursos, e percebi que não podemos fingir que estamos isolados. Concluí que é covardia usar a podridão do sistema como desculpa para alienar-se dele, e que é inaceitável criticar de braços cruzados quem não adota a mesma postura e vai à luta usando as regras do próprio sistema. Concluí, então, que este ano eu tenho que de algum jeito participar ativamente em alguma chapa concorrente para o DCE, pois esta é a maneira mais simples e direta de fazer aquilo que o Marcelo denominou de Democracia Direta. O momento existencial que vivo agora me faz desejar ser mais do que um observador empolado (coisa que psicólogos fazem com muita freqüência) e fazer as coisas com minhas próprias mãos, mesmo que isto me leve a envolver-me com os partidões e suas sujeiras (acredite, já estou no meio delas antes mesmo de ter feito qualquer coisa especial). E, por fim, é esta imagem que tenho do DCE como um monstro de sete cabeças que me faz querer enfrentá-lo. É o cheiro de desafio que ele emana que me atrai. Eu sempre tive um complexo de herói.Está na hora de encarar alguns dragões.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Minha Ausência

Como os leitores devem ter notado, este tem sido um mês de vacas magras em atualizações no Espadachim Cego. Gostaria de explicar esta situação.

Normalmente, meus textos são escritos quando eu quero escrever, e quando tenho um assunto relativamente estruturado em minha mente. Quando não tinha um assunto mas tinha desejo de escrever, eu rapidamente descobria alguma abobrinha que chamasse atenção o suficiente para fazer pipocar alguma idéia. Isto continua ocorrendo, mas com uma freqüência muito menor. Por outro lado, estou lendo muito mais do que antes.

Acho que estou em uma fase mais receptiva do que produtiva atualmente, e estou elaborando as coisas de forma diferente. Não quer dizer que vou parar de escrever aqui. Ainda gosto muito de fazer isso. Apenas, muito provavelmente, não vou escrever feito um tarado por um tempo.

Insanidades de Aspirante à Asceta

São 3 da manhã aqui em Porto Alegre e eu ainda estou acordado. Mas apesar de estar tão tarde, e ao contrário do que é meu costume, não estou vagabundeando: além de ler, estou treinando Kung Fu.

Sim, é no mínimo contraditório que eu esteja exercitando minha disciplina num horário onde qualquer asceta já estaria dormindo há um bom tempo. Irei corrigir esta minha impostura futuramente, mas no momento tenho outras prioridades.

A principal atualmente é estabelecer uma rotina diária de exercícios físicos. Até não muito tempo atrás, eu fazia dia sim, dia não uma bateria de exercícios variados. Contudo, depois de passar para a faixa verde relaxei e perdi este hábito. Contudo, não pretendo simplesmente voltar a fazer a mesma coisa, já que pedi conselho sobre este assunto para meu mestre e ele foi claro: flexões, abdominais e resistência em base cavalo. Já fazia todos estes anteriormente, só que em intensidade muito menor. A mudança mais radical foi com a resistência. Antes, ficava 3 minutos e meio parado; agora, faço 7 minutos.

Segundo meu professor, este é o único exercício que eu não posso parar nunca de fazer, pois é através dele que nosso corpo se acostuma com o fluxo de chi, a energia vital, e se torna mais forte. Estudante de um curso epistemologicamente materialista, fiquei um tanto quanto cético quanto a esta afirmação dele. Mas, ei, ele é mestre no assunto e eu não. Alguma diferença deve fazer, fluxo de chi ou não.

Não tenho nenhum dado conclusivo até o momento, mas tenho a impressão de que ele está certo.

domingo, 12 de outubro de 2008

Eu e a Literatura

Considero a literatura uma das mais fantásticas criações humanas. Não falo da capacidade geral de escrita, desenvolvida eras atrás por alguma civilização obscura, mas dos trabalhos maravilhosos que surgiram através dela. Não canso de me impressionar com o fato de ser possível pegar um livro escrito centenas de anos atrás e ainda assim não apenas entender o que o autor queria dizer, mas sentir empatia e identificação com ele. Carl Rogers, em seu livro “Tornar-se Pessoa”, fala que não pode deixar de considerar o filósofo Soren Kierkegaard um amigo sensível e altamente receptivo, mesmo tendo ele morrido há mais de cem anos. E sou obrigado a dizer o mesmo de Rogers, que apesar de ter morrido antes mesmo de meu nascimento, influencia-me bastante com sua serena e apaixonada defesa da liberdade humana para crescer e da pesquisa científica como um meio para este crescimento. Outro amigo meu é Tolstoi, que em “My Confession” relata o angustiante caminho que trilhou, da descrença em tudo que lhe fora ensinado anteriormente, de seu desespero e suas idéias de suicídio até a sua salvação através da descoberta de um novo sentido espiritual para sua vida. Ele, junto com outros tantos escritores, falecidos ou não, cujos livros me marcaram levam-me a crer que a literatura é mais do que um amontoado de palavras unidas de forma coerente ou mera forma de sublimar a libido, mas uma verdadeira irmandade humana, que me leva a conhecer o melhor de mim mesmo através das descobertas que outros deixaram aqui antes de partirem.

Vida Dura (Parte 18)

E hoje, dia 12 de outubro, é Dia das Crianças. Mais uma data fajuta inventada para forçar pais, mães, padrinhos, madrinhas, avôs, avós e praticamente todo tipo de ser humano diretamente ligado ao trato de crianças gaste seu rico dinheirinho nos brinquedos da moda, roupas de grifes do tipo "Tigor T. Tigre", comidas insalubres e outras porcarias para acalmar a sanha materialista de seus pimpolhos.

Mas não estou criticando o Dia das Crianças, muito pelo contrário! Durante um bom tempo eu fui um grande beneficiário do 12 de outubro, levando meus pais a gastarem seus salários em algum brinquedo especialmente chamativo que vi em algum lugar por aí, e que em menos de um ano (ou menos de um mês) era esquecido e substituído por outro. Considerando que as porcarias que me atraiam eram provavelmente caras, não era um bom negócio do ponto de vista financeiro para meus pais reforçar este meu comportamento, mas acho que era melhor do que me ver esperneando e gritando no meio do supermercado pelo boneco "Megavoltronzord" e suportar olhares de desaprovação de todos os transeuntes. Também há de se argumentar que o sorriso de uma criança não tem preço, especialmente se for do seu filho. Isso parece propaganda de loja de produtos infantis, mas também deve ter seu fundo de verdade (não que eu saiba na prática, considerando que não tenho filhos).

Quando pequeno, eu dividia os presentes que recebia em duas grandes classes: brinquedos e roupas. Se alguém quisesse me fazer feliz, era só me dar um brinquedo, por mais fuleiro que fosse. Roupas são OK hoje em dia para mim, mas lá pelos meus oito ou nove anos, elas eram para mim o que os americanos chamam de "big fucking no-no". Em outras palavras, eu via roupas como brinquedos não ganhos. Meus pais sabiam (e sabem até hoje) que se eu tiver que escolher entre algum gadget e peças de vestuário, eu não hesitarei em escolher o primeiro, e por isso já iam pedindo desculpas quando apareciam com uma camiseta para eu experimentar ou não contavam as roupas que me compravam como presentes. Já meus parentes, padrinhos e semelhantes nem sempre sabiam disto, e apareciam com uma blusa (com um palhaço ou similar bordado na frente, possivelmente piniquento) embrulhada cuidadosamente em papel vermelho. Nas primeiras vezes que isto aconteceu, peguei o embrulho, rasguei-o com ardor esperando encontrar alguma traquitana super-mega divertida para me decepcionar com um amontoado de lã costurado. E enquanto eu era exortado a vestir a nova roupinha ficava pensando "Cadê meu Hot Wheels, cacete?", ou a coisa mais parecida que minha mente infantil era capaz de formular. Para quê eu iria querer roupas novas? Aquela calça de abrigo manchada de lama e minhas camisetas do Mickey sujas de chocolate eram mais do que suficiente! Minha mãe discordava de mim (e até hoje me enche o saco dizendo que eu preciso de mais roupas) e provavelmente ficava tão entusiasmada quanto eu ficava desapontado com roupas.

Claro, nunca expressei diretamente minha raiva contra as pessoas que me compravam roupas de Dia das Crianças (e aniversário, Natal ou qualquer outra data-desculpa), pois fui bem educado pelo meus pais, que colaboraram com sua parte para continuar o mal-estar da civilização que Freud falava, e me ensinaram a não reclamar dos meus presentes. Não em público pelo menos.

Com o tempo, aprendi a identificar o tipo de presente ainda pelo embrulho. Pacote grande, mole e levemente disforme? Blusão. Disforme, mas pouco volumoso? Deve ser uma camiseta. Na verdade, não pensava muito no que havia dentro do embrulho, por que depois de descobrir que ganharia mais roupas, meu cérebro só conseguia pensar "NÃO É BRINQUEDO!", e era forçado a conter o desapontamento de se expressar de maneira muito óbvia.

Como já disse antes, hoje não me importo em ganhar roupas de presente, apesar de não me sentir entusiasmado com a possibilidade. A não ser que a roupa em questão seja uma camiseta com uma estampa inteligentemente abobada. Quanto aos brinquedos, ainda gosto mais deles, mas meus interesses mudaram bastante e se tornaram mais restritos. Por exemplo, um bonequinho do Pikachu não é o tipo da coisa que eu pediria para um Amigo Secreto, o que é algo bem significativo para quem já teve de ouvir do próprio pai que eu preferiria assistir Pokémon a fazer sexo. Gosto ainda de jogos de computador, mas disponho de tão pouco tempo para jogá-los que acho desperdício comprar mais deles. Gadgets como pendrives e HDs externos são sempre bem vindos.

Mas, para ser sincero, não vejo muita necessidade em ganhar presentes hoje em dia. Claro, é legal ganhar coisas, mas não é algo de que eu precise. A não ser que sejam livros. Eu sempre preciso de livros, apesar de já ter uma pilha bem grande aqui do meu lado.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

As Provações da Faculdade XXXI

Duas horas para inventar uma conclusão decente para o trabalho. Minhas conclusões fedem.

As Provações da Faculdade XXX

Toda vez que olho para o relógio, me apavoro, pensando se vai dar tempo de escrever tudo.

Lições da Vida Universitária

São duas e meia da manhã e eu deveria estar dormindo, mas como fiquei assistindo vídeos estupidamente engraçados sobre filmes absolutamente escrotos e tenho um trabalho para entregar AMANHÃ sobre educação não-formal, eu estou acordado, e levemente hiperativo.

O trabalho, esqueci de mencionar, é em grupo, e falta eu escrever a minha parte. Isto está sendo particularmente complicado por que não consigo pensar em nada bom, por menos que seja. Decidi dar uma lidinha no que meus colegas já tinham escrito. Ainda na primeira linha do primeiro parágrafo, dou de cara com a seguinte oração: "Não demorou para que percebêssemos o intrincado e complexo caminho que se abria uma vez que tal pergunta foi feita."

Meus colegas estão enchendo murcilha. Isso fica evidente pelo fato de que alguém decidiu escrever duas palavras sinônimas na mesma frase. Dizer que algo é "intrincado e complexo" é o mesmo que dizer que a água é "molhada e úmida". Eu conheço bem demais o brainstorming de onde esta aberração lingüística saiu. Algum colega meu (posso até dizer o nome dele), também em plena madrugada, decidiu começar a escrever o texto e pensou "essa porra tá curta demais... eu preciso de mais linhas. Já sei! Eu vou colocar umas palavras complicadas a mais aqui e vou dar a impressão de que eu li mais do que as revistas que meu dentista deixa na sala de espera!". E, assim, "intrincado e complexo" vira parte do texto. Não culpo meu colega. Também já fiz isso. Com as MESMAS DUAS PALAVRAS QUE ELE USOU POR QUE EU QUERIA ENROLAR E AO MESMO TEMPO DEIXAR MEU TRABALHO COM CARA DE ERUDITO! Já ouviram falar em marcadores biológicos de doença? Resumidamente, se você tem um, também tem uma doença. Nasceu um bebê com cara de asiático em uma família de suecos? Síndrome de Down! Olhos inchados, vermelhos e riso fácil? Alguém fumou maconha! Um alienígena saiu de sua barriga e estourou as suas tripas? Você é Sigourney Weaver! "Intrincado e complexo" é o marcador literário que indica claro desejo de enrolação, especialmente se aparecerem nas PRIMEIRAS DUAS LINHAS do trabalho.

É uma tática grosseira para fazer volume no trabalho, que, além de desnecessária, é um tiro no pé. Desnecessária por que os professores, a ABNT e mesmo a APA fazem de tudo para que nossos trabalhinhos pareçam mais rechonchudos do que realmente são, começando com o infame espaçamento 1,5 entre as linhas, passando pela introdução e conclusão e finalizando com as malditas referências. Um tiro no pé por que faz quem quer que esteja corrigindo o trabalho ative "Código Amarelo de Ensebação". Eu fico imaginando o que meus professores pensam quando vêem uma coisa dessas:

-"Intrincado e complexo"? Espera um pouco, essas palavras não significam a mesma merda? Por que diabos esses animais colocaram uma do lado da outra? Puta que pariu Hermes esse trabalho deve tá uma merda. Deixa eu ler isso com mais cuidado.

E, como frequentemente ocorre, o trabalho realmente está uma droga! Só que, se não fosse o nosso marcador literário, talvez o professor nem levantasse a hipótese de seus queridos aluninhos serem uns folgados. Há modos e modos de fazer trabalhos ruins e com pouco esforço, alguns mais sutis do que outros. Talvez você seja um destes escolhidos pela natureza que não só conseguem escrever um monte de abobrinha, como arrumam um séquito de seguidores que lê cada imbecilidade sua como se fosse o mais precioso bálsamo sagrado (alguém aqui poderia citar uma pessoa assim?), e, talvez o professor vire seu fã também! E eu sei, "séquito de seguidores" é tão ruim quanto "intrincado e complexo", mas eu não ganho nota nenhuma por escrever este texto e vocês não ganham dinheiro nenhum para lê-lo (até, bem pelo contrário, vocês gastam dinheiro para acessar esse amontoado de absurdos que é a internet e a blogosfera). Mas isso não vem ao caso aqui! O que eu quero dizer é que é plenamente possível passar em uma disciplina na faculdade realizando trabalhos medíocres ou até mesmo estúpidos, desde que você saiba fazer isto de uma maneira bonitinha.

E esta maneira bonitinha não inclui "intrincado e complexo". Provavelmente inclui neologismos retardados e expressões nonsense como "maximização de dividendos", "upgrade técnico-industrial do paradigma quântico" ou qualquer palavra nova que apareça em livros de Psicologia em geral. Mas nunca use "intrincado e complexo". Diga que é sofisticado, diga que é complexo, ou diga que é intrincado. Mas sob hipótese alguma, use "intrincado e complexo" na mesma frase. NUNCA!

Agora, com licença, preciso mudar aquela porcaria de trabalho antes que seja tarde demais.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Fast Food

Estava voltando para casa, aqui em Caxias, quando decidi que iria comer alguma coisa no caminho (já que a geladeira daqui está quase vazia). A primeira coisa que pensei foi "onde posso encontrar um lugar barato para comer?". A única resposta que consegui pensar foi "na Lancheria do Parque... na Osvaldo Aranha. Em Porto Alegre". O bairro onde moro é meio desprovido de estabelecimentos de alimentação, mas não consegui lembrar de nenhum lugar aqui em Caxias que seja tão bom e barato quando a fabulosa Lanchera. Decidi que iria comer um Xis mesmo, do Casagrande. Paguei dez reais por um troço que em Porto Alegre pagaria cinco.

Esta é a prova cabal de que sou mais portoalegrense do que caxiense atualmente.